Projeto da Dosimetria entra em debate com análise técnica de professor da Univali
Especialista explica mudanças na legislação penal, progressão de regime e ressocialização

O projeto de lei que modifica critérios de cálculo das penas e regras de cumprimento de prisão pode ser votado no Senado Federal nesta quarta-feira (17). Conhecida como PL da Dosimetria, a proposta altera dispositivos do Código Penal e da Lei de Execução Penal, foi aprovada pela Câmara dos Deputados na semana passada (11) e aguarda análise da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) antes de seguir para o Plenário da Casa.
Para contribuir com a compreensão técnica do tema, o diretor da Escola de Ciências Jurídicas e Sociais da Universidade do Vale do Itajaí (Univali), professor Alceu de Oliveira Pinto Júnior analisa como o projeto redefine parâmetros utilizados na fixação das penas, especialmente nos casos em que uma única conduta resulta em mais de um crime. “A proposta dialoga com discussões históricas do direito penal brasileiro, em especial a distinção entre concurso material e concurso formal, o que interfere diretamente no cálculo final da pena”, explica.
#PraTodosVerem: Foto do prédio do Supremo Tribunal Federal (STF) em Brasília, com a estátua da Justiça em primeiro plano.Fundamentos jurídicos da proposta
De acordo com o professor Alceu, quando há mais de uma ação e mais de um crime, hipótese em que as penas são somadas, ocorre o chamado concurso material. Já quando uma única ação resulta em dois ou mais crimes, se aplica o concurso formal, situação em que se considera a pena mais grave, acrescida de um percentual, conforme o grau de culpabilidade.
“O projeto propõe que, em determinados crimes contra o Estado Democrático de Direito, o cálculo siga a lógica do concurso formal quando houver uma única ação. Isso altera o tempo total de cumprimento da pena e impacta diretamente a execução penal”, afirma.
O texto aprovado também prevê mudanças em regras relacionadas à progressão de regime e à remição da pena pelo trabalho ou pelo estudo, inclusive em modalidades como prisão domiciliar.
Execução penal e ressocialização
Ao comentar a redução do percentual mínimo exigido para progressão de regime em alguns casos, o professor contextualiza a medida dentro da política criminal.
“A progressão faz parte da lógica do sistema penal. A pena tem duração definida e, em algum momento, a pessoa retorna ao convívio social. Quanto mais estruturado for esse processo, maiores são as chances de reintegração”, avalia.
Segundo ele, a efetividade da pena está relacionada não apenas ao tempo de encarceramento, mas à capacidade do sistema de promover responsabilização e ressocialização.
“Um sistema de execução penal que aproxima gradualmente o condenado da sociedade tende a reduzir a reincidência. Isso é um dado consolidado no pensamento penal contemporâneo”, destaca.
O professor também ressalta que alterações mais benéficas na legislação penal podem ter aplicação retroativa.
“A lei penal mais favorável alcança quem ainda está cumprindo pena ou respondendo a processo. Do ponto de vista administrativo, essa aplicação é plenamente viável com os sistemas informatizados atuais”, explica.
Alcance da proposta
Embora o Projeto da Dosimetria tenha sido associado, no debate público, aos episódios de 8 de janeiro de 2023, o professor ressalta que as alterações previstas não se restringem a esse contexto.
“As mudanças incidem sobre a legislação penal como um todo e afetam outros tipos de crime e de execução de pena”, afirma.
A análise apresentada contribui para qualificar o debate público ao deslocar a discussão para seus fundamentos jurídicos e para os efeitos práticos da legislação penal, oferecendo à sociedade elementos técnicos para compreensão de um tema complexo e de impacto estrutural.



